26 de abril de 2020

Moçambique: Contributos Para a História (José Milhazes, 2007)



Para os que se interessam pelo tema das relações entre a União Soviética e Moçambique e não sabem ler russo, publico aqui um trecho de um livro com dados relevantes. 

“Rússia (URSS) nas guerras da segunda metade do séc. XX”. M., Triada-farm 2002. Pág. 402-407

Luta armada do povo de Moçambique pela liberdade e a independência (1965-1979)

Moçambique foi uma colónia (território ultramarino) de Portugal. Grupos de políticos nacionais do país, que consideravam ser necessário conseguir a independência do domínio estrangeiro, começaram a formar-se nos anos 30. Mas a luta armada começou apenas em 1965, quando um destacamento de guerrilheiros armados até um posto português.

Nessa altura, já existiam várias organizações políticas, que tinham como objectivo a independência da pátria dos colonizadores portugueses. As mais fortes entre elas eram a COREMO e FRELIMO. As suas sedes encontravam-se em Lusaca (Zâmbia) e na Argélia, mais tarde, na Tanzânia.

A União Soviética começou a prestar apoio à FRELIMO praticamente desde o momento da sua formação. Nos primeiros tempos, prestava apoio financeiro e ajuda na preparação de quadros políticos e militares.

Em Janeiro de 1969, os terroristas mataram o dirigente da Frelimo, E. Mondlane. Samora Machel tornou-se presidente da FRELIMO. Nessa altura, no Sul da Tanzânia e na Zâmbia, estavam instalados campos de guerrilheiros, de onde lançavam operações no território de Moçambique. Em 1973, a luta de guerrilha abrangeu o Norte e Centro do país. O exército português perdia gradualmente o controlo das regiões rurais. A luta das forças governamentais contra os guerrilheiros não tinha êxito. A grande operação anti-guerrilha “Nó Górdio”, realizada pelos colonizadores, teve apenas efeitos temporários.

Em Abril de 1974, em Portugal teve lugar um golpe militar, a “revolução dos cravos”. O governo que chegou ao poder anunciou o fim da política de repressão nas colónias e criou aí governos de transição. Nessa situação, aumentava a luta pelo poder em Moçambique. Aí teve lugar um levantamento de tropas coloniais que tentaram criar no território do país uma “segunda Rodésia”, ou seja, um Estado onde o poder estaria nas mãos da minoria branca. Porém, as Forças Armadas Populares de Moçambique e as tropas que chegaram de Portugal esmagaram o levantamento. A luta pelo poder tinha também lugar entre os grupos que lutavam pela libertação da dependência colonial. A instabilidade política, (403) os boatos sobre as ameaças de repressão contra os brancos, as declarações do novo governo sobre a intenção de nacionalizar a indústria provocaram, nessa altura, uma saída em massa do país da população branca. Além disso, das regiões de pecuária intensiva era levado o gado para a República da África do Sul, era retirada a maquinaria das melhores empresas, levado o transporte automóvel de transporte.

No momento da proclamação da independência, a 25 de Junho de 1975, nas poucas fábricas que funcionavam em Moçambique durante o colonialismo praticamente não ficaram quadros técnicos, meios de transporte e maquinaria moderna.

Samora Machel, dirigente da FRELIMO, foi eleito Presidente da República Popular de Moçambique. Perante o novo governo colocava-se um grande número de problemas e um dos mais importantes era a garantia da capacidade de defesa do país.

A República Popular de Moçambique transformou-se imediatamente num país da linha da frente. No Sul e Este era ameaçada pela República da África do Sul (RAS) racista, cujo governo via em Moçambique a base do movimento de libertação nacional no próprio país. Além disso, para as regiões industriais do Norte do RAS (Transvaal) a qualquer momento podiam surgir dificuldades com o trânsito de mercadorias através do porto de Maputo.

Problemas político-militares e económicos análogos preocupavam as autoridades racistas da Rodésia do Sul. O governo de Moçambique anunciou a sua solidariedade com os movimentos que lutavam contra o racismo e o apartheid.

No território de Moçambique começaram a montar as suas bases os guerrilheiros que lutavam contra o regime racista no território da Rodésia do Sul. A aviação rodesiana começou a bombardear localidades no território de Moçambique onde poderiam encontrar-se guerrilheiros, eram enviados grupos de comandos para a luta contra eles nessas regiões.

Em Moçambique, com o apoio da Rodésia do Sul e RAS, organizações da oposição a FRELIMO desencadearam uma guerra de guerrilha contra o governo.

A situação exigia a reorganização imediata do exército guerrilheiro da FRELIMO – Forças Populares de Libertação de Moçambique – em forças armadas regulares. O governo da jovem república pediu ajuda à União Soviética. O primeiro grupo de conselheiros militares soviéticos chegou a Maputo em 1976. Ele começou o trabalho de formação do estado-maior e dos ramos fundamentais das forças armadas. Foram elaborados planos de organização das forças armadas, realizada a escolha de um contingente para estudar nas escolas militares superiores na União Soviética.

Nas forças armadas de Moçambique planeava-se criar tropas terrestres, força aérea e defesa anti-aérea, forças navais e tropas fronteiriças. Os conselheiros e especialistas militares soviéticos (404) realizaram um grande trabalho de planificação da preparação militar e ensino de quadros militares locais no país. Estava prevista a criação de sete brigadas, vários batalhões de infantaria, unidades de manutenção. Os conselheiros e especialistas soviéticos prestaram grande ajuda à parte moçambique na organização de centros de mobilização e recrutamento.

Depois da assinatura de um acordo sobre cooperação militar, a Moçambique começaram a chegar equipamentos militares e armamentos da União Soviética. Nessa altura, estavam a ser preparados na URSS pilotos de caças, tripulações de aviões de transportes e helicópteros Mi-8, pessoal técnico. Em 1979, ao porto de Nacala chegaram 25 aviões Mig-17. A montagem e preparação dos aviões foram realizadas na base aérea militar dessa cidade por especialistas soviéticos. Os pilotos moçambicanos que tinham recebido instrução na URSS aperfeiçoavam aí a perícia militar sob a direcção de instrutores soviéticos experientes. Em 1985 foi formada uma esquadrilha de Mig-21b. Na mesma base, oficiais para-quedistas soviéticos formaram e prepararam um batalhão de desembarque aéreo, realizavam exercícios de desembarque aéreo e tiro.


José Milhazes, 10 de Junho de 2007
http://darussia.blogspot.pt