29 de setembro de 2019

Embaixador de Moçambique em Portugal defende que é preciso continuar a estudar Gungunhana



O embaixador de Moçambique em Portugal, Joaquim Bule, defendeu no sábado a necessidade de se estudar mais a história de Gungunhana, o último imperador de Gaza, que passou dez anos desterrado em Angra do Heroísmo, nos Açores, Portugal.

“De tempos em tempos, é importante aproveitar o trabalho dos pesquisadores, dos historiadores, dos realizadores de cinema para, em conjunto, perceberemos o que foi a história de uma figura incontornável para Moçambique no passado, no presente e no futuro. Idem para as relações de Portugal e Moçambique”, adiantou, em declarações à Lusa, alegando que é preciso estudar a história de Gungunhana “com isenção”.

Joaquim Bule falava à margem de uma conferência, promovida pelo município de Angra do Heroísmo, que marcou o início de um ciclo de eventos comemorativos da chegada de Gungunhana à ilha Terceira, em 27 de junho de 1896.

Capturado por Mouzinho de Albuquerque, em 1895, Gungunhana, imperador de Gaza (atualmente Moçambique), esteve três meses preso em Monsanto, junto com sete mulheres e companheiros de guerra, mas as manifestações da população junto à prisão e as críticas nos jornais ao Governo pela forma como os prisioneiros eram tratados, levaram a que fosse desterrado para a ilha Terceira, onde viria a morrer dez anos depois.

A poligamia era mal vista pelos portugueses e só lhe foi dada hipótese de se fazer acompanhar por uma das sete mulheres, mas elas terão rejeitado a hipótese e acabaram por ser deportadas para São Tomé e Príncipe, com Gungunhana a viajar apenas com o filho Godide, o tio e conselheiro Molungo e Zixaxa, um chefe de uma tribo que tinha atacado Lourenço Marques (atual Maputo) e que ainda hoje tem descendentes na ilha.

Passados 123 anos da chegada de Gungunhana à Terceira, a autarquia de Angra do Heroísmo iniciou um ciclo de eventos comemorativos, que só deverão terminar em 2021, com uma conferência e com a colocação de uma placa evocativa da efeméride na Fortaleza de São João Baptista, onde foi feito prisioneiro o último imperador de Gaza.

Para o embaixador de Moçambique em Portugal, a evocação da memória de Gungunhana em Angra do Heroísmo deve ser analisada “não do ponto de vista cultural ou histórico, mas fundamentalmente do ponto de vista das relações internacionais”.

“Nós vemos o interesse da Câmara de Angra do Heroísmo pela história de Gungunhana como sendo o interesse de fortalecer as relações que existem entre Portugal e Moçambique. As relações entre países são coisas que devem ser bem compreendidas, coisas que têm alicerces muito profundos, particularmente tratando-se de Portugal e Moçambique”, frisou.

Humilhado quando capturado e enviado para Portugal, Gungunhana foi declarado herói quando os seus restos mortais foram transladados para Moçambique.

“Ele é um herói efetivamente porque resistiu à dominação colonial portuguesa e defendeu o seu território até onde conseguiu fazê-lo”, salientou Joaquim Bule, lembrando que o imperador só foi capturado ao fim de dez anos.

A Fortaleza de São João Baptista, em Angra do Heroísmo, foi local de exílio para figuras relevantes como o rei D. Afonso VI, os presos políticos do Estado Novo ou Gungunhana e o município “não podia descurar esta figura”, segundo o autarca Álamo Meneses.

“A passagem de Gungunhana deixou traços, que para além de históricos são também humanos – há aqui descendentes do Zixaxa – e deixou na nossa memória coletiva uma história que todos nós sabemos. Para além daquilo que ouvíamos na escola, também ouvíamos em casa, que em tempos esteve aqui um rei vindo de Moçambique”, frisou.

Para o presidente da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo, mais do que estudar a história do último imperador de Gaza, é preciso relembrá-la e contextualizá-la.

“Essas memórias precisam de ser, de alguma maneira, desempoeiradas e particularmente precisam de ser integradas num contexto mais vasto, que começa com a conferência de Berlim, que passa pelo Mapa Cor-de-rosa e que desemboca no ultimato inglês, que leva ao assassinato de D. Carlos, que leva à República, que leva a 70 anos da ocupação de Moçambique”, afirmou.



Lusa, 29 Julho 2019