Militares portugueses do Esquadrão dos Dragões participaram num massacre em Angola que envolveu violência extrema e decapitação dos corpos, revela o livro "O império colonial em questão" de António Araújo (edições 70), que ontem o jornal Público divulgou.
Foi uma matança hedionda. Aconteceu a 27 de Abril de 1961 e foi uma acção de vingança pelo massacre de 15 de Março de centenas de colonos brancos pela UPA no norte de Angola.
Este massacre dos colonos é, naturalmente, tão hediondo como o anterior. Homens, mulheres, crianças foram mortos, esventrados, decapitados, queimados.
Está por fazer a catarse dos crimes praticados durante a guerra colonial. Estes são conhecidos mas não foram assimilados pela população portuguesa, não entraram na consciência colectiva.
Esta realidade tem muito a ver com a forma como é ainda vista a luta de libertação e o colonialismo, dentro dos códigos do politicamente correcto e da ideologia dominante da esquerda.
Na luta de libertação, tudo foram feitos heróicos.
No colonialismo e na guerra colonial, tudo foi opressão e chacina.
A catarse da descolonização também está por fazer, sobretudo em relação a Angola.
Como fomos incapazes de defender os nossos interesses minímos e a que papéis nos prestámos durante o período de transição, até à independência de Angola a 11 de Novembro.
Há um decreto pouco conhecido que traduz bem o que é o nosso nó na garganta no processo de independência de Angola, em relação ao qual nunca fizemos a expiação.
A lei é assinada pelo Alto Comissário de Angola Silva Cardoso em 3 de Fevereiro de 1975, no quadro do Governo de Transição do território ainda português.
Decreta que o dia da matança das centenas de colonos brancos a 15 de Março de 1961 passa a ser feriado nacional:
"Considerando que é dever do Governo de Transição de Angola exaltar os feitos primordiais levados a cabo durante a luta de libertação nacional pelos três movimentos de libertação, a FNLA, o MPLA e a UNITA; tendo em consideração o significado histórico na luta de libertaçãonacional de Angola, as datas: 4 de Fevereiro de 1961, ataque às prisões de Luanda, dirigido pelo MPLA; 15 de Março de 1961, ataque generalizado no Norte de Angola dirigido pela UPA(FNLA); 25 de Dezembro de 1966, ataque a Teixeira de Sousa, dirigido pela UNITA. Usandoda faculdade conferida pelos Capítulos II e III do Acordo de Alvor, o Governo de Transição decreta e eu promulgo, o seguinte: Artigo único - Os dias 4 de Fevereiro, 15 de Março e 25 de Dezembro são considerados feriados, em todo o território nacional, tendo os trabalhadores direito ao seu salário. Aprovado em Conselho de Ministros- Johnny Eduardo, Lopo do Nascimento e José N'Dele. O Alto Comissário, General Silva Cardoso"
Paulo Gaião
Expresso, 17 de dezembro de 2012