José Eduardo Agualusa: "O único país que até hoje me censurou foi Portugal"
A revelação do escritor angolano foi feita ontem, na casa Fernando Pessoa, durante uma mesa redonda sobre Crónica e Ficção, no primeiro dia do evento Letras em Lisboa II, e que juntou o brasileiro Luís Fernando Veríssimo, Agualusa, Patrícia Reis, moderado por Inês Pedrosa.
A história, explicou José Eduardo Agualusa,aconteceu quando lhe pediram um texto para a revista de bordo da TAP, tendo o autor entregue um conto chamado "A Morte do Pai Natal", conto esse, aliás, "escolhido pelo Nobel de literatura nigeriano Wole Soyinka para constar de uma antologia dos melhores contos africanos."
"Qual não foi o meu espanto quando, duas semanas depois, me ligaram dizendo que não o podiam publicar porque poderia ofender os passageiros angolanos", contou o escritor.
Em relação a Angola, Agualusa revelou que nunca teve nenhuma experiência igual no seu país, onde é mais conhecido pelas crónicas que escreve nos jornais do que pelos romances que publica. Não deixou, no entanto, de responder ao público sobre a recente polémica à volta de uma opinião literária sobre a obra poética de Agostinho Neto. "O problema não teve que ver com ninguém do governo, mas sim de pessoas isoladas que exigiram a minha prisão. Daí considerar-se, adiantou, "o primeiro dissidente poético da História".
Por seu lado, questionado sobre as fronteiras da crónica e da ficção, o brasileiro Luís Fernando Veríssimo - que mantém uma crónia mensal no jornal português Expresso - lembrou alguns dos personagens por si criados e que se tornaram muito populares entre os seus leitores. Como aquela personagem que, durante a ditadura militar, disse o escritor, "era a única a acreditar na honestidade do governo de então. Virou até atracção turística".
Inês Pedrosa, actual directora da Casa Fernando Pessoa, trouxe para o debate as diferenças entre o que se escreve no Brasil e como se escreve, e os constrangimentos de publicar num país pequeno como Portugal. "Certa vez, numa loja da Baixa, tive de ouvir uma senhora que havia ficado ofendida com uma crónica minha saída essa semana, num jornal."
Letras em Lisboa II continua, esta tarde de sexta-feira, com várias mesas redondas, no teatro São Luíz, com a presença de escritores como Germano Almeida, Leonor Xavier, Fernando Morais, Francisco José Viegas, Zuenir Ventura, Amílca Bettega, Teolinda Gersão, José Carlos Vasconcelos, entre outros.
JA
Sapo AO, 08 de Maio de 2009