Uma trilogia de memórias me vem à cabeça, sempre que falamos no Bispo Dom Manuel Viera Pinto, que nos deixa uma saudade e o sentido de que a sua missão está distante do final.
Primeiro, quando foi expulso de Nampula, ali no aeroporto, bem próximo de sua residência, em 1974, afirmando para os microfones da rádio “…saiu pela porta grande e com as minhas malas, todavia, quem me expulsou, sairia pela janela e sem nada em suas mãos…”. Não foi apenas uma saga, pois, meses depois se confirmava o que antes parecia sonho.
A minha geração ainda teve o privilégio de escutar muitas das homilias. Falava com sentido de oportunidade e de forma convincente. Repetia, bem alto e em bom tom, que gostaria de morrer em Nampula e de ser sepultado à entrada da Sé Catedral, para continuar próximo de seus fiéis.
Em segundo lugar, me recordo da famosa carta dele e dos sacerdotes da sua diocese, sob o título "Imperativo de Consciência", que eu nunca cheguei a ler, aparentemente redigida pelos padres Combonianos, um documento demasiado famoso para ser ignorado, em contexto moçambicano. Aliás, essa carta não agradou ao Governo de Marcelo Caetano, ao exigir uma resposta corajosa aos problemas graves do povo moçambicano.
Finalmente, a carta que Dom Manuel Viera Pinto escreveu a Samora Machel, em Setembro de 1986, um mês antes do factício acidente que o roubou do nosso convívio. Esta carta, aliás, merece uma releitura. Samora e Vieira Pinto conversavam e debatiam este país com profundidade e respeito. Assim, com a devida vénia, transcrevo à carta. Oxalá, um dia o seu maior desejo em vida, seja satisfeito e regresse à sua cidade de coração, Nampula.
O povo não sabe onde pôr o coração
A confiança que Vossa Excelência nos merece, como Presidente da Frelimo e da República Popular de Moçambique, leva-nos a falar, mais uma vez, das violências que não cessam de humilhar e destruir o nosso povo. A guerra continua e com ela a violência, a humilhação, os abusos, os excessos, as atrocidades e os crimes. Permita-nos, Senhor Presidente, que falemos, concretamente, das violências que, neste momento, mais humilham e esmagam o nosso Povo, mais destroem o país e o encobrem de vergonha e de sangue: os massacres, as execuções sumárias, os assassinatos, as n.... e as torturas.