Quem escutar os dirigentes políticos europeus e os seus megafones mediáticos há-de julgar que a crise é passado e o futuro promete ser brilhante com base num presente de alívio em que finalmente os indicadores económicos, essas bulas emitidas pelos sacerdotes do mercado, dão sinais de que todos vamos pelo bom caminho.
A mensagem dos indicadores económicos resume-se numa penada: a economia da União Europeia, mesmo dos países sob protectorado, começou a recuperar, o desemprego tende a diminuir, afinal a austeridade tardou mas começou a dar resultados, não estava errada como até alguns dos seus executores disseram. A propaganda amplia os registos com trombetas histéricas, uma bíblia das publicações financeiras do espaço europeu ousa até falar em “milagre económico” e logo no caso de Portugal, imagine-se. Alguém deveria ter alertado o escriba de que a mesma expressão foi usada no caso do Chile de Pinochet para saudar a devastação económica e social assente em dezenas de milhares de mortos, muitos mais presos políticos, pragas de miséria e desemprego, extinção da segurança social – caos de que o país não recuperou passados 40 anos.
O mundo tem uma larga experiência de que os indicadores económicos não dão emprego nem de comer a ninguém, estão nas tintas para as desigualdades sociais, borrifam na substituição de empregos estáveis por trabalho precário, podem até ser tanto mais fantásticos quanto maior o número de cidadãos que se aproximam da condição de escravos. Os tão prometedores indicadores económicos que todos os dias são apregoados pelos arautos da propaganda assentam em estruturas económicas arrasadas, em direitos laborais e sociais esmigalhados, em direitos humanos extintos. Os indicadores sobem, a tragédia humana continua a ampliar-se. Os indicadores evoluem, a sociedade apodrece sem recuperação no horizonte.
Olhemos de relance para a União Europeia: 26 milhões de desempregados, quase seis milhões de jovens sem trabalho, milhões na miséria ou à beira da pobreza e da exclusão social, quase um terço das crianças pobres e socialmente excluídas, mais de nove por cento dos cidadãos europeus submetidos a uma situação de privação material severa, quase um milhão de pessoas sem abrigo, enquanto continua a crescer o número de famílias que perdem a habitação para os bancos.
Este é o retrato real da Europa, aquele que as pessoas sentem em carne viva enquanto o regime canta indicadores como quem anuncia prémios de lotaria viciada onde a taluda continua a sair aos milionários, cada vez mais numerosos – e também generosos e gratos para com os carrascos que aplicam a austeridade.
Atente-se no caso de Durão Barroso, o foragido primeiro-ministro de Portugal que se transformou em presidente da Comissão Europeia depois de ter contribuído para lançar uma guerra assassina que devastou o Iraque e que agora deixa a União Europeia neste estado. Acaba de receber o prémio Carlos V, destinado aos que se distinguiram “no desenvolvimento da Europa” e que lhe vai nutrir a conta bancária em mais 45 mil euros.
A União Europeia é uma criminosa burla a descoberto.
Jornal de Angola, 21 de Janeiro de 2014