28 de abril de 2025

Portugal: Os Graves Riscos do Empobrecimento da Classe Média (5 de Maio de 2008)


As más notícias chegam em catadupa. A Comissão Europeia prevê que os rendimentos das famílias portuguesas em 2008 vão ser pressionados pela inflação (que vai subir), por condições financeiras mais apertadas (juros mais altos e mais dificuldade na obtenção de crédito bancário) e pelas incertezas macroeconómicas, em particular o aumento galopante dos preços do petróleo e da alimentação (que devem crescer 39% este ano!)

Como resultado, Bruxelas prevê pelo terceiro ano consecutivo, desde 2006, que os salários reais venham a cair de novo, penalizando a generalidade dos trabalhadores. Se a isto juntarmos que Portugal é o segundo país europeu onde é maior a desigualdade entre ricos e pobres e que em 2009 passaremos de sétimo a nono país mais pobre da União, sendo ultrapassados pela Eslováquia e Estónia no "ranking" da riqueza por habitante (PIB per capita ajustado pelas paridades do poder de compra), ficamos com uma ideia clara das enormes dificuldades que atravessamos e de quanto temos de nos esforçar para ultrapassar esta situação.

Provavelmente, o que de mais grave tem acontecido em Portugal desde 2002 e que mais consequências dramáticas pode ter no futuro é a pauperização da classe média. E um país sem classe média é uma auto-estrada para o banditismo, a violência e a criminalidade. É sobre isto que têm obrigatoriamente de reflectir os governantes e os empresários: os primeiros porque têm conduzido uma política orçamental onde uma das pedras de toque foi o congelamento salarial durante três anos na função pública; os segundos porque as estatísticas mostram que, da riqueza produzida no país, cada vez é menor a fatia que cabe ao factor trabalho e maior a que vai para o factor capital.

E têm de reflectir pela prosaica razão que um país crescentemente desigual e sem segurança não atrai turismo de qualidade nem o de terceira idade que compra casas para passar uma parte do ano; não atrai quadros qualificados; e não atrai investimento. Ora isto é tudo o que Portugal não pode admitir. Se alguma vantagem comparativa temos, a segurança era, até agora, uma delas. Parece, contudo, estar a perder-se. As explicações podem ser várias (aumento da população nas zonas urbanas, desemprego crescente a afectar a população, em particular os imigrantes, etc.), mas convém não fazer como a avestruz e meter a cabeça na areia: a principal razão para o que estamos a assistir é o empobrecimento da classe média. Evitar que a tendência se torne irreversível deve ser o objectivo de todos os que querem viver num país onde se possa continuar a sair à rua sem medo de ser assaltado.

Última nota: o Estado tem de cortar as suas adiposidades. Mas convém fazê-lo com bom senso. Não é admissível que haja esquadras só com um polícia, que assiste impotente à agressão de um cidadão à sua frente. A ideia que passa é que o país está cada vez mais inseguro - e que a polícia não tem meios para combater o crime.

À semelhança de Pessoa

EX-BANQUEIRO, EDITOR, POETA E PINTOR. Quem olha para Paulo Teixeira Pinto não reconhece nele o banqueiro anarquista que Fernando Pessoa descreveu em livro. Mas quem ainda o vê como o banqueiro sério e circunspecto, quase carrancudo, que durante dois anos liderou o BCP, ou quem se lembra dele como secretário de Estado da presidência do Conselho de Ministros de Cavaco Silva, contido e reservado, com uma marcada imagem de direita, não reconhecerá certamente o pintor que expõe actualmente na First Gallery, em Lisboa, ou o investidor que comprou a Guimarães Editores e constituiu um Conselho Editorial que João Lobo Antunes diz representar 30% do PIB português que pensa. E quem desconhece que ele tem um livro de poesia pronto a ser publicado certamente ainda se surpreende mais. No meio de tantas personagens, Paulo Teixeira Pinto mantém, contudo, uma enorme coerência: por contrato, a Guimarães está proibida de editar qualquer livro seu. E a receita da venda dos quadros em exposição vai integralmente para a Associação Ajuda de Berço e para a Associação Portuguesa dos Doentes de Parkinson. É só, é tudo e é muito.

O custo de chumbar

Quando se fala da ineficácia do nosso sistema de ensino, raramente está presente a lógica economicista. E, no entanto, ela não é despicienda. Na verdade, cada estudante que reprova representa um aumento anual da despesa pública em educação de três mil euros. Este valor multiplicado pelos 233 mil alunos que chumbam ou abandonam a escola antes de terminar o ensino secundário traduz um encargo anual para os cofres públicos da ordem dos 700 milhões de euros. Para se ter ideia, este valor representa nove vezes mais aquilo que o Estado prevê investir em 2008 no conjunto do sistema educativo...

Não é por isso desprovido de sentido pensar que as teorias do eduquês que são contra a retenção do aluno (eufemismo para chumbo) se casam harmoniosamente com as necessidades de redução da despesa pública. Só que se chumbar não resolve o problema, passar um aluno sem saber nada também não leva a lugar algum - a não ser a uma sociedade de ignorantes, embora sem défice orçamental...

Cem anos da CUF

Faz agora cem anos que Alfredo da Silva fundou a CUF, a primeira grande empresa industrial portuguesa gerida de forma moderna, que constituiu uma escola de vida, pessoal e profissional, para centenas e centenas de alguns dos melhores quadros que o país conheceu, de Lurdes Pintasilgo a Nobre da Costa, de Vístulo de Abreu a Eduardo Catroga.

Acontece que na semana passada a CUF anunciou a venda do seu negócio de adubos à empresa espanhola Fertiberia. A Cuf - Adubos de Portugal era, até agora, líder nacional e segundo produtor ibérico de fertilizantes.

Diz o grupo que a venda lhe vai permitir concentrar-se nos produtos químicos, que apresentam elevado potencial de crescimento. Será certamente assim. Mas isso não invalida que Portugal perca o seu único produtor de fertilizantes e fique totalmente à mercê de Espanha nesta matéria. Que triste forma de comemorar o centenário da Cuf! E as voltas que Alfredo da Silva deve estar a dar no túmulo!