Aos poderosos nem mossa faz!!!
Beira (Canal de Moçambique) - O conceito de sanções económicas ou políticas ou ainda a combinação das duas como instrumento de política externa tem muito que se lhe diga.
Com o intuito manifesto de influenciar e forçar determinado governo a mudar de atitude ou politica, as sanções já foram ensaiadas e declaradas em diversas ocasiões na história da relações internacionais.
Quanto aos seus efeitos, eles têm sido variados.
Na maioria dos casos quem acaba sofrendo a parte de leão é o cidadão comum, completamente inocente e alheio aos desacordos políticos entre governos.
Decretadas alegadamente para proteger os cidadãos de práticas excessivas normalmente utilizadas ou desenvolvidas por ditadores, as sanções tem alguma utilidade, mas convém dizer que são insuficientes nos seus objectivos.
Antes de existirem ou serem decretadas sanções existiam outras formas de resolução de conflitos. Eram os tempos em que funcionava a diplomacia dos canhões, em que as potências intervinham militarmente para calar qualquer governo que não se abstivesse de prosseguir com aquilo que fosse por elas considerado de inaceitável.
Sintomaticamente quem pratica ou decreta sanções são quase sempre os mesmos governos em momentos diferentes da história. As potências ocidentais foram quem começou a usar este instrumento como parte da sua política externa. Existiram as famosas sanções contra o «apartheid» sucessivamente furadas por nações também ocidentais que tinham muitos interesses económicos na Africa do Sul daqueles dias.
Sem que se entenda as causas ou motivações de qualquer política que seja decidida ou implementada corre-se o risco sério de fazer interpretações distantes da verdade e da realidade.
Uma simples compreensão dos factores e características que começaram a ditar ou a levar os governos a optarem pelo uso de sanções levará a concluir que essa politica é a continuação da diplomacia dos canhões numa nova realidade.
Numa nova situação internacional em que os protagonistas da agora defunta Guerra-fria concluíram que os canhões tinham que se calar, em que o número de potências cresceu, que as colónias passaram a história, em que a opinião pública internacional tornou-se um factor de peso para vencer as eleições, as sanções forma adoptadas como alternativa de pressão.
Mas serão?
Pressionar resulta mesmo que minimamente. Chama a atenção das pessoas de que há um problema.
O fenómeno sanção, a julgar pelo caso mais recente no Zimbabwe deveria merecer um estudo completo, uma reformulação.
Estamos em presença de uma política que se tem mostrado um falhanço quando chega a hora de analisar os resultados. A teimosia e prática de repressão contra a oposição não pararam no Zimbabwe com a declaração de sanções e outras limitações decretadas internacionalmente contra os governantes daquele país.
A atitude lógica por parte das chancelarias deveria ser tentar perceber o que faz com que elas não resultem.
Sanções ou outras intervenções de carácter diplomático visando melhorar a situação de direitos humanos, o sistema de governação, eliminar ditaduras do cenário político só surtirão os efeitos desejados se forem utilizadas onde mais conta. O ponto de aplicação da força é fundamental quando se pretendem resultados concretos.
É como nas greves dos trabalhadores, uma vez decididas, se houver muitos furos, muitos trabalhadores não aderindo, o seu peso e impacto diluem-se.
No caso zimbabweano ou no Sudão, existem países que estão furando o bloqueio, as sanções. A China na dianteira, tem feito fluir fundos e bens numa enorme quantidade. Na RDC também se passa o mesmo. Em Angola e outros países onde a China declarou estar interessada nos seus recursos naturais, a história repete-se. Entre os furadores das sanções não se vê só a China. Há outros países que sem terem as motivações económicas da China, mas apenas movidos por interesses geopolíticos, posicionam-se ao lado de regimes como o de Mugabe.
Mas no concreto quem sofre os efeitos da maior inflação mundial são os cidadãos zimbabweanos que de gente medianamente estável, agora percorre as estradas moçambicanas e outras procurando vender de tudo um pouco e às vezes até o próprio corpo para sobreviver.
Os discursos de Tony Blair e de Gordon Brown tem pouco efeito no que Mugabe faz ou deixa de fazer. A interdição de viagem para o espaço europeu e americano, o congelamento de fundos, tudo acaba contrariado pelas válvulas de escape vindas do Oriente.
As férias dos poderosos déspotas agora já são na Malásia ou algures no Oriente.
Em regra, são as equações estratégicas internacionais dos países e governos mais influentes que definem o peso ou consequência das sanções.
Quando se olha para o panorama internacional somos confrontados com uma aparente senão efectiva falência dos modelos de resolução de conflitos adoptados.
Muitas das decisões tomadas tem em conta o mercado, os interesses económicos, as consequências que adviriam para um mercado e sociedades específicas. Tenta-se fazer um equilíbrio que não prejudique as hipóteses de continuar no poder por via das eleições entre as potências.
E atacar o elo mais fraco não altera na verdade a política que alegadamente se quer ver erradicada.
Não se ataca ou se propõem sanções contra a China porque é um interlocutor de peso e individualmente é o maior mercado do mundo.
Ignora-se que o inverso também é verdade. A China tem necessidade do resto do mundo para colocar as suas mercadorias, para continuar com os actuais níveis de crescimento.
As sanções podem ter melhores efeitos se forem parte de uma politica concertada de relações internacionais.
Impõe-se que os parâmetros, regras, conceitos de relacionamento internacional sejam profundamente alterados.
Há que ter a coragem histórica de olhar para o todo e não unicamente para a parte que nos interessa.
As sanções são unicamente uma peça de um mosaico complexo que possui componentes nucleares e outros mais marginais quanto a sua influência no funcionamento dos países.
Disfunções da Organização Mundial do Comércio, gigantismo da ONU e suas agências, com manifesta falta de dentes para morder e atacar os assuntos mais importantes, definições de interesses estratégicos longe daquilo que são os factores de estabilidade mundial, tudo contribui para tirar valor ao factor sanções.
Olhar para a situação de um país sob sanções como o Zimbabwe e olhar para a incapacidade de estabilizar o Médio-Oriente deve ser visto como coisas, fenómenos da mesma natureza ou pelo menos desaires e falhanços com a mesma origem. Parece que é a persistência em delinear soluções unicamente dentro da caixa que é um país que emperra a concretização de um desanuviamento internacional efectivo.
Tomam-se medidas parciais e pretende-se com isso curar o cancro na sua totalidade.
A Prevenção dos Conflitos tem de significar mudanças no ordenamento e concepção das relações internacionais.
De contrário continuaremos assistindo a sucessão de líderes sem a solução dos problemas que apoquentam o mundo.