OBRA LITERÁRIA DE MIA COUTO
Mia Couto é, sem dúvida, uma referência no campo da literatura de expressão portuguesa, sendo actualmente o escritor moçambicano mais conhecido no exterior.
A sua obra revela ainda influências dos escritores brasileiros João Cabral de Melo Neto e Carlos Drummond de Andrade, do autor moçambicano Craveirinha e de alguns poetas portugueses, como Sofia de Mello Breyner, Eugénio de Andrade ou Fernando Pessoa. A sua obra tem como tema principal a vida do povo moçambicano, um dos mais pobres e martirizados do mundo, que passou por uma guerra civil de 30 anos e onde persiste uma forte tradição de transmissão da literatura e dos saberes essencialmente por via oral. Numa cultura onde se diz que "cada velho que morre é uma biblioteca que arde", Mia empreende uma escrita que liga a tradição oral africana à tradição literária ocidental, tal como ao estudar a floresta como biólogo. Liga o saber ancestral sobre o espírito das árvores e das plantas à moderna ciência da Ecologia. “Eu guardo na minha infância, assim, uma coisa muito esbatida, um ponto de referência, as histórias que me eram contadas, dos velhos que moravam perto, vizinhos do outro lado da rua, de um outro mundo, e eu recordo esse mundo encantado até algumas histórias, sobretudo como eles me deixaram uma marca.” (in Patrick Chabal, Vozes Moçambicanas). Essencial, num caso como noutro, é sempre a relação mais profunda entre o humano e a terra, entre um humano e outro humano, por vezes nas suas condições mais extremas.
O seu estatuto incontestado deve-se não só à forma como aborda os problemas e a vida quotidiana do Moçambique contemporâneo, mas principalmente à criatividade da sua escrita, numa permanente descoberta de novas palavras através de um processo de mestiçagem entre o português "culto" e as variantes dialectais introduzidas pelas populações moçambicanas. Mia é, assim, uma espécie de mágico da língua, criando, apropriando, recriando, renovando a língua portuguesa. Devido a essa autêntica revolução linguística, tem sido comparado a outro grande mágico da Língua Portuguesa do século XX, o escritor brasileiro João Guimarães Rosa.
Pode-se afirmar que, em Portugal, há já um verdadeiro culto por Mia Couto, expresso no fascínio que a sua figura exerce, a que não é alheia a ausência de pose intelectual, a simplicidade nos encontros com o público, durante os quais prefere contar histórias pícaras ou dramáticas do quotidiano de Moçambique, a falar da sua obra.
Publicações:
Raiz de Orvalho – 1999
Vozes Anoitecidas – 1987
Cronicando – 1991
Cada Homem é uma Raça – 1990
Terra Sonâmbula – 1992
Estórias Abensonhadas – 1994
A Varanda do Frangipani – 1996
Contos do Nascer da Terra – 1997
Mar me quer – 2000
Vinte e Zinco – 1999
O Último Voo do Flamingo – 2000
Na Berma de Nenhuma Estrada e Outros Contos – 2001
O Gato e o Escuro – 2001
Um Rio Chamado Tempo, Uma Casa Chamada Terra – 2002
Pensamentos. Textos de Opinião - 2005
A Chuva Pasmada - 2004
O Fio das Missangas - 2004
O Outro Pé da Sereia - 2006
O Beijo da Palavrinha - 2006
Idades Cidades Divindades - 2007
Vozes Anoitecidas - 2008
Venenos de Deus, Remédios do Diabo - 2008