Os estafermos
Hoje, dizem os especialistas, joga-se o destino decisivo da Europa no conclave de governantes reunido para decidir o destino da Grécia, do Euro, do Fundo de Estabilidade, enfim, de todos nós.
Porém, crendo nos analistas, nas notícias, no passado recente, nas indecisões sequenciais, nos adiamentos sucessivos, na indiferença em relação aos gritos de aflição dos que sofrem, surdos aos apelos dos mais ricos, é cada vez mais difícil acreditar que os putativos líderes dos mais poderosos têm envergadura para enfrentar uma crise como jamais se viu na Europa comunitária.
Nem a calculista Merkel, o hesitante Sarkozy, nem o libidinoso Berlusconi, nem o auto-excluído Zapatero revelaram ou revelam capacidades de liderança para enfrentar o temporal que atravessamos. Iguais no medo, vazios nas ideias, medíocres nas decisões. Cada um mais cioso do seu poder pessoal, e do seu partido, do que dos interesses colectivos que assumiram defender e outorgaram a si próprios como se fossem nossos donos.
Explicam-se as indecisões porque têm eleições à porta nos seus países. Enquanto a pobreza alastra, a ruína explode, o desemprego se transforma numa tragédia, destruindo em sucessão as pequenas e grandes economias dos países da UE, estes líderes calculam como gerir o seu poder pessoal, indiferentes à sorte de milhões que têm ajudado a destruir. Não são líderes. São mercenários, iguais a tantos outros, que nos tempos de hoje transformam a política numa função que, cada vez mais, merece desprezo em vez de reconhecimento. Cada vez mais amargura quem a exerce e nos provoca náusea em vez de atenção. É inacreditável a incapacidade de tomar decisões a que esta gente chegou.
A submissão aos ditos mercados que arruínam cidades e países. Não são líderes. São enguias. Sem coragem para decidir, discernimento para assumir riscos, utopias para reconstruírem e se reconstruírem. Não há firmeza nem coerência. Não há paixão nem alteridade enquanto a Europa, que assumem como navio, naufraga sem fulgor nem brilho, perante a sede insaciável dos abutres escondidos nos ditos mercados. Há muito que antigos e actuais estadistas, comprometidos com os velhos ideais europeus alertam para a falta de capacidade, determinação e talento desta trupe que nos arrasta para o abismo mais negro. Parece que nos resta uma única esperança: que a democracia funcione e corra com esta gente do poder. Não fazem falta.
Francisco Moita Flores
Correio da Manhã, 23 de Outubro de 2011