9 de setembro de 2011

A gordura do Estado (Francisco Moita Flores)


A gordura do Estado

Sugar o tutano até à pobreza radical a milhões de contribuintes é um filme gasto e pouco credível.

Não sei quem inventou a expressão mas ela entrou nas narrativas políticas como mel. É capaz de ser, neste momento, a fórmula mais usada para identificar os gastos excessivos do Estado. Retirar a gordura do Estado é uma obsessão do governo. Corre o risco de ter de criar um ministério nutricionista que faça a gestão da coisa. Porém, o diagnóstico é velho. Nos últimos vinte anos, o discurso repete-se com outras variações. Emagrecer o Estado foi outra expressão que, em tempos, se converteu em lugar-comum. Ao fim e ao cabo, quer dizer o mesmo. Precisamos de um Estado esbelto, de curvas bem delineadas, sensual. Porém, as receitas para chegarmos a esse patamar superior da beleza política, escorraçando gorduras, com dietas rigorosas de vegetais, onde pão, carne e peixe são coisa para ricos, têm sempre a mesma fórmula. Começa-se por sugar o sangue aos contribuintes, e as gorduras, alegremente, lá ficam tornando o doente mais doente.

Isto é, o governo precisa de dar com urgência um sinal ao País sobre o corte das adiposidades crónicas. E até agora não o deu. Sugar o tutano até à pobreza radical a milhões de contribuintes é um filme tão gasto e tão pouco credível que só o aceitamos se percebermos que a estrutura do Estado entra em verdadeira dieta severa. Ou seja, que avançam reformas severas na esfera administrativa, na mobilidade de pessoal, na reconversão dos torresmos e toucinhos que se abrigam nos corredores do poder. Dou um exemplo: para aprovar um Plano de Pormenor urbano, são necessários pareceres de vinte e oito (!) instituições do Estado. Coisa que leva, em média, quatro anos a realizar. Conheço uma parte deste labirinto de poderzinhos que habita nos alvéolos mais gordurosos de vários ministérios. Com honrosas excepções, a incompetência domina e a arrogância impera. Consiga o governo reduzir a catorze entidades e tenha a coragem de pôr na rua quem não trabalha e parasita o Estado e pode cantar vitórias dietéticas daqui por mais dois anos. É que é o trabalho fundamental para perder gordura: acabar com a preguiça e correr com preguiçosos. Sem esta coragem, o governo só nos trará mais do mesmo: um Estado mais gordo e flatulento. E a fome do outro lado desta falta de imaginação.

Francisco Moita Flores
Correio da Manhã, 08 de Setembro de 2011