18 de fevereiro de 2025

Moçambique: “Clic’s” de Rangel no pincel de José Pádua (Francisco Manjate, 2008)


Ricardo Rangel é muito mais do que um fotógrafo que nos oferece a imagem através de clic’s únicos e instantâneos. Ricardo Rangel é a essência das coisas porque a sua fotografia transporta consigo a dimensão cultural, política e social. Ricardo Rangel é a celebração da vida em si. Vida feita de imagens e histórias. Histórias de Homens e lugares. Uns góticos outros comuns, mas sempre carregados de essência.

A fotografia de Ricardo Rangel celebra a vida, e a sua essência é para lá do tempo e do universo moçambicano, para se situar numa dimensão da humanidade e de todos os tempos.

Mas esta fotografia é, sobretudo, a súmula da nossa história. Da História de Moçambique. História cultural e política, social e também económica.

Ricardo Rangel é um dos mais importantes fotojornalistas de África, e porque não do mundo? E com a sua máquina fotográfica registou memórias inesquecíveis do nosso passado, do presente e que, a partir delas, nos fazem compreender o que será o nosso futuro, porque ele teve, de alguma forma, um “olho visionário”. De lince. Olho que viu e continuar a ver para além do comum, do simples e do fútil.

Na sua escola – Centro de Formação Fotográfica – Ricardo Rangel não só ensina, diariamente, aos seus alunos, a arte de fotografar através da máquina fotográfica, mas é muito mais do que isso. Ele ensina a arte de registar imagens para a posteridade. Ensina que a imagem fotográfica é antes de tudo, a alma daquele que retrata a história, não somente a figura humana, mas a sua história, o seu mundo, o seu envolvimento.

Ricardo Rangel transmite a confiança, a história, a cultura de um povo, a compreensão dos fenómenos que se pretende registar. Os clics são muito mais do que pegar numa máquina fotográfica e “disparar” para ter fotos. É transmitir a energia existente, tal como as batidas fortes do Jazz e do Blues, do Swing e do Smooth, vertentes musicais que o decano da nossa fotografia abraçou e continua a amá-las como ama a fotografia, a paz e a liberdade.

E se ele ama a paz e a liberdade, concordamos então com a vice-ministra da Educação e Cultura, Antónia Xavier, quando afirmou, no dia do lançamento do livro “Ricardo Rangel: Homenagem de Amigos”, que mais do que dizer que Ricardo Rangel é um excelente fotógrafo, o que há muito se sabe, falar de Ricardo Rangel é falar de um homem que sempre pautou por ideais de humildade e honestidade e que na sua nobre missão denuncia as injustiças e as atrocidades deste mundo.

Falar de Ricardo Rangel é também “falar daquele que eterniza momentos chaves da vida através da imagem, com um significado que exige a interpretação do receptor para a sua compreensão, e que influenciam bastante a formação da crítica e auto-crítica do cidadão, sobre os assuntos cruciais do nosso quotidiano”, este é o sentimento da vice-ministra.

Por isso, a fotografia, tal como toda a arte contemporânea, é uma ferramenta de percepção para a transformação e abertura de novos horizontes da construção da nossa moçambicanidade.

E os amigos decidiram obsequiar-lhe com um livro onde José Pádua, seu amigo de longa data – conheceram-se na década de 1950 na cidade da Beira – pegou nas suas fotografias, particularmente aquelas em que Rangel retrata as crianças e “clicou-as” com pincéis, tinta e na tela.

José Pádua pintou vários quadros a partir de fotografias de Ricardo Rangel, e a escolha por imagens sobre crianças é que ambos – Rangel e Pádua – sempre gostaram de fotografar e pintar as crianças. Sempre tiveram uma grande ternura por crianças, daí Pádua ter sugerido a Rangel que lhe permitisse pintar, a partir das suas fotografias, vários trabalhos. Mais tarde surgiu a ideia de imortalizar tudo isso em livro, sendo que o mesmo ainda apresenta textos escritos por várias personalidades do cenário social e cultural moçambicano.

Vai daí que, o decano da nossa fotografia diga que dedica o livro ao seu amigo e companheiro de trincheiras José Pádua. E que o mesmo é mais de Pádua do que dele propriamente.  

Escola com nome de Rangel

Mas porquê discursos na obra de Ricardo Rangel, se a sua obra por si só é superior a todos os discursos que se pretendem enunciar e tal como o seu autor, ela sabe situar-se por cima de todas as coisas fúteis, com engenho e arte. Ela não necessita de discursos e, muito menos ainda, de justificações. Ela, antes de tudo fala por si mesma, traduzindo o sentimento e a reflexão crítica em torno de questões sociais, ambientais e educacionais.

“Permitam-me sublinhar as palavras sábias do nosso Decano da Fotografia Moçambicana, por ele pronunciadas aquando da exposição sobre os 100 anos da Beira, passo a citar ‘O Mundo andará melhor se houver mais fotógrafos’ existirem melhor andará este mundo porque esta classe reporta com fidelidade qualquer realidade deste Planeta”, disse Antónia Xavier.

Aquela governante deu a conhecer ainda que o Governo, juntamente com os seus parceiros, estão a equacionar a possibilidade de construir uma escola secundária que ostente o nome de Ricardo Rangel, como uma das formas de imortalizar a sua vida e obras.

Quanto à editora Ndjira, que chancela a obra, esta, na voz do seu gestor, Fernando Couto, sente-se feliz pela edição de um livro que beneficia da especial característica da junção das actividades artísticas de dois vultos de relevo nas artes fotográfica e pictórica – Ricardo Rangel e José Pádua – e da circunstância de os seus autores serem amigos de longa data.

A Ndjira também se sente orgulhosa, porque esta obra constitui a sincera homenagem prestada por alguns admiradores ao incontornável fotojornalista que é Ricardo Rangel, autor de uma obra que tem vindo a plasmar o retrato inconfundível – inconfundível pelo seu carisma humanístico e pelo seu mérito expressionista – deste povo nas suas vivências e nas mais diversas faces.