Alfabeto para combater a pobreza – M como Mercado
É difícil ser sociólogo sem alimentar tendências imperialistas. Não me refiro, claro, ao tipo de imperialismo, cujo combate e destruição deu corda aos fazedores da nossa independência. Esse Imperialismo é demasiado poderoso para fazer parte do aparato duma disciplina tão simples como a sociologia. Refiro-me mais ao tipo de Imperialismo que se manifesta através da tendência de querer comentar tudo, mesmo quando não fazemos a mínima ideia do que se trata. É um defeito profissional intrínseco à sociologia pelo que nem vou tentar curá-lo. Prefiro render-me completamente e navegar na onda saborosa das certezas que o defeito me injecta. É uma espécie de dopamina que explica, por acaso, donde vem a energia para andar a escrever alfabetos de tudo mais alguma coisa. Dopamina, este neuro-transmissor que por vezes é chamado de hormona da felicidade, soa perigosamente próximo de “dopar” como em fulano de tal estava dopado...
Bom, isso era para preparar o terreno. Quero reflectir sobre a noção de mercado, mas como não sou economista – nem nunca serei – vou fazer este exercício de reflexão partindo da sociologia. A noção de mercado é assunto de economistas, como todos nós sabemos, pelo que é sempre bom pedir licença. Os sociólogos, porém, podem reclamar a noção para si próprios com o argumento segundo o qual tudo o que acontece na sociedade seria da sua competência. E mercado, trá-lá-lá, não existe fora da sociedade. Há melhor argumento do que esse. É o seguinte: uma vez que o mercado descreve relacionamentos entre indivíduos ele é também da competência da sociologia. Trá-lá-lá, outra vez. Isto é, o mercado é uma outra maneira de falar de relações sociais, mas relações sociais de um certo tipo, nomeadamente um tipo que envolve transacções entre indivíduos. O mercado, portanto, seria apenas uma abstracção que nós fazemos para melhor apreendermos essas transacções.
Bom, isso era para preparar o terreno. Quero reflectir sobre a noção de mercado, mas como não sou economista – nem nunca serei – vou fazer este exercício de reflexão partindo da sociologia. A noção de mercado é assunto de economistas, como todos nós sabemos, pelo que é sempre bom pedir licença. Os sociólogos, porém, podem reclamar a noção para si próprios com o argumento segundo o qual tudo o que acontece na sociedade seria da sua competência. E mercado, trá-lá-lá, não existe fora da sociedade. Há melhor argumento do que esse. É o seguinte: uma vez que o mercado descreve relacionamentos entre indivíduos ele é também da competência da sociologia. Trá-lá-lá, outra vez. Isto é, o mercado é uma outra maneira de falar de relações sociais, mas relações sociais de um certo tipo, nomeadamente um tipo que envolve transacções entre indivíduos. O mercado, portanto, seria apenas uma abstracção que nós fazemos para melhor apreendermos essas transacções.
Mesmo no caso do Mercado Central ou do Mercado de Xipamanine, não obstante a existência dum espaço físico bem delimitado, duma estrutura física bem típica, de contextos temporais dentro dos quais as transacções ocorrem, se não houvesse essas relações sociais bem específicas, não haveria mercado. Portanto, mercados, na verdade, não têm existência real senão na imaginação humana que precisa sempre de se agarrar a alguma coisa. Ao mesmo tempo, contudo, mercado é praticamente tudo, ou melhor, é imanente. Eu até acho curiosa a designação “economia de mercado”. Sei que é um truque político para a distinguir da “economia planificada”, mas falando a sério, que economia não é de mercado, nem planificada? Só é possível apreciar o pouco sentido que esta distinção faz – pelo menos para aquele que não tem a visão limitada por constrangimentos ideológicos – se se tomar a decisão consciente de reduzir o mercado ao seu elemento básico, nomeadamente o tipo específico de relações sociais que dão substância ao mercado.
Uma coisa que muito me espanta no nosso país é que desde que abraçámos os charlatães que apregoam as virtudes da economia do mercado menos importância temos vindo a dar ao seu princípio básico de deixar que seja o mercado a tomar as decisões por nós com aquela mão invisível de que já ouvimos falar. Invisível quer dizer que nunca ninguém a viu; dava para perguntar donde vem a convicção de que ela existe, mas isso é, provavelmente, outro assunto. De qualquer maneira, com a vinda dos charlatães temos vindo a planificar a nossa economia muito mais do que o fizemos nos gloriosos tempos. O que levanta em mim a suspeita de que não estamos a erigir uma economia de mercado (sic) em Moçambique é o facto de nunca ter ouvido nenhum patrão a queixar-se dos programas de redução de pobreza. Em todo o mundo civilizado os primeiros a estarem contra qualquer iniciativa de combate à pobreza – que dizem só encorajar a preguiça – são os patrões, mas no nosso não. Até é um Presidente empresário que força essa agenda!
Para dizer o quê com isto? É simplesmente para dizer que a articulação do combate à pobreza com o desafio da construção duma economia de mercado proporciona-nos uma belíssima possibilidade de tornar esse combate mais nosso ao mesmo tempo que nos permitiria saber realmente quem está connosco, e quem não. O que precisamos para ter mercados robustos? De certeza que não é de gente pobre que precisamos.
E. Macamo
in Notícias.co.mz